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quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

As carpideiras


Todas as manhãs elas partem para o cemitério e param diante das sepulturas onde a morte apanhou recentemente alguém.
Dão-lhes figos, tâmaras e ovos. Um mais pobre lhes oferece um ramo de jasmins. Elas ficam sentadas no meio das tumbas. Algumas amamentam os filhos, outras tecem vários cestos e outras nada mais fazem que conversar.
De repente a mais velha solta um grito. Elas cobrem as cabeças e põem-se a emitir lamentos angustiosos. A outro sinal recomeçam suas ocupações e suas tagarelices.
Entre essas carpideiras Sahaddah é a mais bela e a mais jovem. Por isso lhes dão frequentemente galinhas. Eu me casarei com ela. Certamente é forte e silenciosa, e se eu morrer primeiro suas lamentações nada custarão a meu pai!


Do livro Jardim da Carícias – clássico da literatura amorosa, rara jóia literária produzida pelo gênero lírico dos árabes em todos os tempos – Editora Artenova.


Carpideira é uma profissional feminina cuja função consiste em chorar para um defunto alheio. É feito um acordo monetário entre a carpideira e os familiares do defunto, a carpideira chora e mostra seus prantos sem nenhum sentimento, grau de parentesco ou amizade.

Vem de longe esse ofício, já no Egito Antigo era comum a presença das carpideiras nos enterros. Acreditavam ser a morte uma passagem e o choro seria necessário para que a alma do morto fizesse uma passagem tranqüila.
No túmulo de Minnakht (1500 -1450 a.C.), em Tebas, estão as "Carpideiras do Egito".


Oito séculos depois, em Roma, o ritual das carpideiras era oficialmente indispensável nos velórios. Havia duas classes de carpideiras, a saber:
Prefica, a carpideira paga para os louvores do morto e a Bustuári, que acompanhava o cadáver até o local de incineração, pranteando-o estridentemente conforme a tabela de preços.

Uma outra modalidade muda e simbólica são as Choronas, bonecas, geralmente vestidas de branco com véu negro cobrindo cabeça, rosto e os ombros, com faces sulcadas e cheias de lágrimas.

As carpideiras foram conhecidas em toda a Europa e a tradição de chorar, dançar e ter uma refeição dedicada aos mortos é possivelmente universal.


No Brasil, indígenas e escravos africanos usavam a mesma prática para chorar seus mortos.
Recebemos dos portugueses a carpideira espontânea, lamentando o defunto alheio, gratuita e vocacionalmente. Geralmente os donos do defunto davam-lhe lembranças, roupas, alimentos, dinheiro em troca do ruidoso pranto.

Ainda hoje, no interior brasileiro o chorar o defunto resiste - defunto sem choro é símbolo de indiferença e abandono total.
Os rituais são realizados por velhas ligadas por parentesco, amizade ou por simples vocação. Elas fazem guarda ao defunto iniciando as Excelências ou Incelências, rezas cantadas com voz sinistra e apavorante, que duram até a saída do enterro, de impressão inesquecível para os que assistem. Nessas localidades existem mulheres famosas e ilustres, indispensáveis ao cerimonial popular, de irresistível provocação para o pranto.


Fonte: Dicionário do Folclore Brasileiro - Câmara Cascudo
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3 comentários:

  1. Curioso este texto! Não sabia que ainda existiam as carpideiras. Hoje, quando vou a um funeral só vejo chorar a família e os amigos mais íntimos...de resto, já vi de tudo: atenderem o telemóvel, darem um beijo à namorada, rindo e comentando qualquer assunto do dia...
    Não, a morte, já não merece o respeito de antigamente, ainda que fosse com lágrimas compradas.
    Gostei da postagem
    Beijo e bom fds.
    Graça

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  2. Minha querida ,
    acabei de ler seu recadinho...que posso lhe dizer : fico muito feliz com o sucesso do seu Noel...Faça ,venda, ganhe um dinheirinho kkk e sobretudo si divirta!!!eu te desejo muito sucesso com ele.Estive fazendo umas galinhas de pano muito fofas ,decorativas uma beleza para enfeitarmos a cozinha... ...quem sabe um dia resolvo fazer um "sal" delas ....seria muito divertido....beijos.

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  3. Excelente matéria, Estela!
    Faço "vênia", para a fonte...
    Xêro!

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